9 de dez. de 2008

Quem criou as margaridas?



Quem criou as margaridas?



A pergunta ecoou, pelo vale, numa voz terna e infantil. Ninguém soube, exatamente, de onde partiu, mas, uma vez, enunciado o problema, exigia uma resposta.

Jean Baptiste, o mico pintor, assim batizado em registro e devidamente identificado por um chip, descendente de uma linhagem muito antiga - como se houvessem linhagens que não fossem antigas - achou a pergunta um pouco vaga. O vale era selvagem, entregue, totalmente a natureza, logo, não havia um cultivador de margaridas! Elas apareciam, com o vento, ou trazidas por pássaros. A verdade é que a pergunta lançou luzes sobre uma querela antiga, mais do que a linhagem de Jean Baptiste... Para encurtar caminhos, respondeu ao vento: Foi Deus.

Porém, sentiu uma incontrolável vontade de pintá-las, imortalizando, assim, a bela criação. Seu olhar de artista observou, atentamente, as pequenas flores que formavam um grande tufo branco, amarelo e verde. Uma combinação perfeita de cores e de volume.

Nhandu , a velha ema gaúcha, que passeava, placidamente, pelo vale, não deixou de notar a perfeição da reprodução.

- Parabéns! – disse, dirigindo-se a Jean Baptiste. - Seu quadro espelha, com perfeição, a beleza das margaridas... Uma perfeição, mais do que perfeita, até, eu diria.

- O sonho dos artistas, obrigada minha senhora, mas nada pode ser mais perfeito do que a natureza. O homem tendeu a intensificar as cores, a transformar os aromas, a redesenhar os espaços e olha o que aconteceu? Agora, busca a pureza das coisas, a matriz... Quer beber a água na fonte, cristalina e pura.

- Não importa quem criou as margaridas. – sentenciou o mico pintor – Importa é que elas estão aqui, perfeitas, e ao nosso alcance.

A ema raspou o chão, com as patas, e encontrou uma saborosa minhoca. O mico quebrou a casca de um coquinho de butiá. O vento soprou, forte, balançando as margaridas, que, absortas a tudo, sugavam água do solo. O sol começou a descer e a lua a aparecer, timidamente. Nuvens coloridas instigaram a atenção do pintor. E as margaridas ganharam um contorno delicado, no quadro. A ema procurou abrigo e o mico guardou as tintas. As nuvens mandaram água... As margaridas contaram a história de um mico e uma ema, que pintaram um belo quadro que refletia o mundo perfeito, imaginado há muito tempo.

Viamão, 9 de dezembro de 2008.

Autoria: Fernanda Blaya Figueiró
Revisão: Angelita Soares